CONTOS, POEMAS, POESIAS
AS DORES E OS REMÉDIOS
DE NOSSAS AVÓS
Como eram diferentes os tipos de dores que sentíamos e também os remédios caseiros que nossas avós aplicavam para saná-las. Alguns até hoje funcionam melhor que muitos produtos farmacêuticos.
A dor de dente era a que mais judiava. Haja mascar dente de alho para os dentes. Também não era pra menos, chupávamos manga a “torto e à direita”; comíamos pêssegos ainda verde e de vez em quando mordíamos os caroços “sem querer”; além disso, chupávamos cana e na maioria das vezes, numa gana incrível mordíamos os gomos que quase quebravam os dentes e sugávamos então aquele caldo gostoso e açucarado. A mais gostosa delas era a cana caiana de colmos arroxeados (ou caiena), introduzida no Brasil quando da Invasão da Guiana Francesa. Uma delícia... e depois dizemos não saber porquê alguns de nós desenvolvemos a Diabetes.
Os machucados e estrepes de vidros, limalhas de ferro, farpas de madeira e espinhos nos pés eram rotineiros. E as dores de barriga? Nem se fale; era uma atrás da outra. Também comíamos de tudo e toda espécie de fruta com aquela gulodice que todos sabem, sem medir qualidade e quantidade.
E as verrugas e os bichos de pé? No que concerne às verrugas, minha vó sempre dizia que não era para apontar o dedo para as estrelas, pois uma verruga poderia surgir no dedo; e se a verruga magicamente nascesse, ela aconselhava a passar um pedaço de toucinho na verruga e depois jogá-lo num formigueiro. Crendice, não, veja lá! Quanto aos bichos de pé, cada semana era um de nós que estava com aquele pé dolorido, pedindo agulha para aliviar a dor, pois andávamos e brincávamos descalços nos fundos dos quintais, sem proteção alguma. A agulha tinha que ser queimada antes de ser introduzida nos pés.
E os joelhos ralados, onde se utilizava compressa quente e sal? E as dores de cabeça, de garganta e dor d´olho? Cada garoto ou garota tinha um tipo de dor para ser curado, não esquecendo as dores psicológicas, etc... E as dores de ouvido, as infecções cutâneas, as tosses, as queimaduras?
Daí os santos remédios caseiros de nossas avós: losna, limão, alho, folha de mamona e alguns fármacos da época: óleo de rícino extraído da mamona (usado como laxante e também para as lombricóides); Biotônico “Fontoura”, o Vick Vaporub que servia para quase tudo; o mercúrio cromo, licor de cacau e Emulsão de Scott. Sobre este último remédio: minha mãe e às vezes minha avó, faziam com que eu tomasse aquele “bendito” óleo de fígado de bacalhau. Veja bem - era preciso seguir um ritual, ou seja, segurar uma chave da casa nas mãos e olhar para o espelho, enquanto o ingeria. Tudo para tirar a atenção. Eu odiava aquilo, pois era difícil de tomar, mas de certa forma foi bom pelas vitaminas que continha. O frasco desse remédio com a imagem de um homem com um peixe enorme nas costas passava a ideia de quem tomasse aquilo ficaria muito forte.
Bem, voltando aos remédios caseiros: fatias de batata crua para acabar com as dores de cabeça; agrião e mel, e flor de sabugueiro para tosse e gripe; a casca de banana (lado de dentro) para passar na urticária e queimaduras além de polpa de abóbora ralada e pomada de agrião com manteiga e sal; maçã para regular o intestino. Para as dores de garganta, gargarejo com água morna e sal.
O mais engraçado de tudo é que esses medicamentos caseiros na maioria das vezes funcionavam... Não dá para esquecer também das simpatias e dos benzimentos.
(Do livro Quando eu Andava Descalço. Lembranças de criança.)
Bar do Tonico
Em plena avenida, lugar de grande movimentação de pessoas, onde o comércio em geral andava a toda, situava o Bar Pinguim do Tonico, conhecido point da cidade.
Por ali passavam centenas de carros todos os dias e nem se fala do grande número de transeuntes.
O Bar Pinguim precisava ser vendido, pois, apesar de bom movimento e freguesia certa, o jovem Tonico queria mudar de ramo.
Ali se fazia o melhor café da cidade; os mais saborosos salgadinhos; e a caipirinha mais adequada ao gosto do freguês, pois utilizava cachaças de alambiques famosos da região. No entanto, apesar de todos esses produtos de alta qualidade, o Tonico queria mesmo desenvolver outro ramo de atividade, só que precisava, primeiramente, vender o bar.
Numa tarde, Tonico teve uma brilhante ideia. Engendrou uma estratégia para vender o bar rapidamente, e logo apareceu um comprador, pois o Pinguim era conhecido pela vasta clientela que possuía.
Marcou-se o dia com o comprador de nacionalidade japonesa para ele fazer visita às instalações e apreciar o movimento. Tonico, então, dentro do que havia planejado, convidou amigos e conhecidos para ir até ao bar e tomar café, saborear salgadinhos e tomar caipirinhas por conta da casa, tudo para impressionar o comprador. Dentre os convivas, um pedia uma coisa, outro outra; um salgadinho aqui, um café ali, uma caipirinha. Aquele furdunço. Realmente um grande movimento.
Aconteceu que o japonês ficou impressionadíssimo com o movimento. Só que, quando arguido sobre a compra do bar, ele categoricamentre disse: - que tudo era muito bom, a clientela ótima, mas... só que pra ele e pra sua esposa não ia dar, pois exigia muito trabalho e tinha muita gente pra ser atendida. Nós estamos querendo: um bar mais sossegado, menos movimentado.
Assim com essa decisão inesperada, o Tonico continuou com o bar e arcou com o prejuízo do que ofertou gratuitamente.
O tiro saiu pela culatra!
(Do livro TRAPALHADAS.)
POEMAS: HAICAIS
No lago Igapó
a garça passa alegre
Igapó continua
Marés altas e baixas
como a vida
entendimento
O silêncio
apenas o vento roçando
um dia no sítio
(do livro: Maihaicais)
Agapanto branco
arranjo das noivas
flor do amor